Author: Betânia Uchôa
•05:48:00
PRIMAVERA

Ah! quem nos dera que isso, como outrora,
inda nos comovesse!
Ah! quem nos dera que inda juntos pudéssemos
Agora ver o desabrochar da primavera!
Saíamos com os pássaros e a aurora,
e, no chão, sobre os troncos cheios de hera,
sentavas-te sorrindo, de hora em hora:
"Beijemo-nos! amemo-nos! espera!"
E esse corpo de rosa recendia,
e aos meus beijos de fogo palpitava,
alquebrado de amor e de cansaço....
A alma da terra gorjeava e ria...
Nascia a primavera...E eu te levava,
primavera de carne, pelo braço!
(Olavo Bilac)


Author: Betânia Uchôa
•05:46:00

O Poço


Meu amor, o que encontras
em teu poço fechado?
Algas, pântanos, rochas?
O que vês, de olhos cegos,
rancorosa e ferida?

Não acharás, amor,
no poço em que cais
o que na altura guardo para ti:
um ramo de jasmins todo orvalhado,
um beijo mais profundo que esse abismo.

Radiosa me sorri
se minha boca fere.
Não sou um pastor doce
como em contos de fadas,
mas um lenhador que comparte contigo
terras, vento e espinhos das montanhas.

Dá-me amor, me sorri
e me ajuda a ser bom.
Não te firas em mim, seria inútil,
não me firas a mim porque te feres.

¬ Pablo Neruda ¬
Author: Betânia Uchôa
•06:11:00



A DANÇA
Não te amo como se fosse rosa de sal, topázio
ou flecha de cravos que propagam o fogo:
te amo secretamente, entre a sombra e a alma.
.
Te amo como a planta que não floresce e leva
dentro de si, oculta, a luz daquelas flores,
e graças a teu amor vive escuro em meu corpo
o apertado aroma que ascender da terra.
.
Te amo sem saber como, nem quando, nem onde,
te amo directamente sem problemas nem orgulho:
assim te amo porque não sei amar de outra maneira,
.
Se não assim deste modo em que não sou nem és
tão perto que a tua mão sobre meu peito é minha
tão perto que se fecham teus olhos com meu sonho.
-Pablo Neruda-


By Luna Gitana

Author: Betânia Uchôa
•06:07:00

História

Eras a Musa
eu, o poeta...

Aconteceu naquele instante
em que, displicente,
me estendeste a mão dizendo adeus
- como que diz até logo, -
e eu tive a impressão de que subitamente,
minha vida era uma nova Pompéia
que submergia em lavas para os séculos.

Agora
revendo as provas dos velhos poemas
que me queimaram,
te desenterro estátua irreconhecível
entre cinzas e palavras,
lembranças de um mundo em que fomos personagens,
e em que hoje, és história,
e eu, - arqueólogo.

(J.G. de Araujo Jorge)

                                        By Davi
Author: Betânia Uchôa
•10:32:00


Enquanto não atravessarmos a dor de nossa própria solidão, continuaremos

a nos buscar em outras metades. Para viver a dois, antes, é necessário ser um.

*Fernando Pessoa*
Author: Betânia Uchôa
•10:26:00

Uma Maior Solidão

Uma maior solidão
Lentamente se aproxima
Do meu triste coração.

Enevoa-se-me o ser
Como um olhar a cegar.
A cegar, a escurecer.

Jazo-me sem nexo, ou fim...
Tanto nada quis de nada,
Que hoje nada o quer de mim.

Fernando Pessoa
Author: Betânia Uchôa
•10:05:00


Canção grata

Por tudo o que me deste
inquietação cuidado
um pouco de ternura
é certo mas tão pouca
Noites de insónia
Pelas ruas como louca
Obrigada, obrigada
Por aquela tão doce
e tão breve ilusão
Embora nunca mais
Depois de que a vi desfeita
Eu volte a ser quem fui
Sem ironia aceita
A minha gratidão

Que bem que me faz agora
o mal que me fizeste
Mais forte e mais serena
E livre e descuidada
Sem ironia amor obrigada

Obrigada por tudo o que me deste
Por aquela tão doce
e tão breve ilusão
Embora nunca mais
Depois de que a vi desfeita
Eu volte a ser quem fui
Sem ironia aceita
A minha gratidão


Florbela Espanca
Author: Lenara
•15:34:00

As sem-razões do amor

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matem)
a cada instante de amor.

Carlos Drummond de Andrade



Formatações Lenise Marques
Author: Betânia Uchôa
•13:40:00
Poema

Quando é para você
o poema se faz sozinho.
As letras se procuram
como folhas douradas
no vento de outono.
E num canto do parque
formam o ninho macio
de um pássaro que canta
para celebrar a vida.

-Alvaro Bastos 


Author: Betânia Uchôa
•13:37:00

ESCULTURA

Eu já te amava pelas fotografias.
Pelo teu ar triste e decadente dos vencidos,
Pelo teu olhar vago e incerto
Como o dos que não pararam no riso e na alegria.

Te amava por todos os teus complexos de derrota,
Pelo teu jeito contrastando com a glória dos atletas
E até pela indecisão dos teus gestos sem pressa.

Te falei um dia fora da fotografia
Te amei com a mesma ternura
Que há num carinho rodeado de silêncio
E não sentiste quantas vezes
Minhas mãos usaram meu pensamento,
Afagando teus cabelos num êxtase imenso.

E assim te amo, vendo em tua forma e teu olhar
Toda uma existência trabalhada pela força e pela angústia
Que a verdade da vida sempre pede
E que interminavelmente tens que dar!...

(Adalgisa Nery)
Author: Betânia Uchôa
•13:25:00



Viola

Minha cantiga servia
para dizer coisas densas
que apenas eu mesma ouvia.

Foi a palavra quebrada
por muito encontro guerreiro:
ferozes golpes de espada
na tênue virtude alada
de um coração prisioneiro.

Cantar não adianta nada.

Explicar-se não se explica.

Por entre coisas imensas,
torto e ignorado se fica.

Com pensativos vagares,
de fundos poços me abeiro:
chorar é muito mais fácil
e talvez mais verdadeiro.

Cecilia Meireles


Author: Betânia Uchôa
•10:49:00

♥ Lenise Formatações e Poesias-Entre ♥


INFÂNCIA

Levaram as grades da varanda
Por onde a casa se avistava.
As grades de prata.

Levaram a sombra dos limoeiros
Por onde rodavam arcos de música
E formigas ruivas.

Levaram a casa de telhado verde
Com suas grutas de conchas
E vidraças de flores foscas.

Levaram a dama e o seu velho piano
Que tocava, tocava, tocava
A pálida sonata.

Levaram as pálpebras dos antigos sonhos,
Deixaram somente a memória
E as lágrimas de agora.

Cecília Meireles



Author: Betânia Uchôa
•07:09:00


ADOTAREI O AMOR

Adotarei o amor
e o escutarei cantando,
e o beberei como vinho,
e o usarei como vestimenta. 

Na aurora, 
o amor me acordará e
me conduzirá aos prados distantes. 

Ao meio dia,
conduzir-me-á à sombra das árvores 
onde me protegerei do sol como os pássaros. 

Ao entardecer conduzir-me-á ao poente,
onde ouvirei a melodia da natureza 
despedindo-se da luz,
e contemplarei as sombras da quietude 
adejando no espaço. 

À noite,
o amor abraçar-me-á,
e sonharei com os mundos superiores 
onde moram as almas 
dos enamorados e dos poetas. 

Na primavera,
andarei com o amor, lado a lado,
e cantaremos juntos entre as colinas;
e seguiremos as pegadas da vida, 
que são as violetas e as margaridas;
e beberemos a água da chuva, 
acumulada nos poços,
em taças feitas de narciso e lírios. 

No verão,
deitar-me-ei ao lado do amor
sobre camas feitas com feixes de espigas, 
tendo o firmamento por cobertor
e a lua e as estrelas por companheiras. 

No outono,
irei com o amor aos vinhedos
e nos sentaremos no lagar,
e contemplaremos as árvores se despindo
das suas vestimentas douradas
e os bandos de aves migratórias 
voando para as costas do mar. 

No inverno,
sentar-me-ei com o amor diante da lareira
e conversaremos sobre os
acontecimentos dos séculos
e os anais das nações e povos. 

O amor será meu tutor na juventude,
meu apoio na maturidade,
e meu consolo na velhice. 
O amor permanecerá comigo até o fim da vida,
até que a morte chegue,
e a mão de Deus nos reúna de novo.

-Kahlil Gibran-
Author: Betânia Uchôa
•07:01:00
"Lágrima"

Orvalho do sofrer - dentro do peito nasce
e nos olhos em pranto sem querer floresce;
aumenta a pouco e pouco, e cada vez mais cresce...
- e rola finalmente em gotas pela face...

sublime florescer da dor... se ela falasse
diria para o mundo a mais sentida prece,
no entanto, em seu silencio humilde é que enternece
pois guarda na mudez um triste desenlace...

Repentina, ela brota, assim como se fosse
( de um mar que em nosso peito as ondas estugisse)
uma gota que o vento, aos nossos olhos, trouxe...

Nuns olhos de mulher, porém, ainda não disse:
- é a pérola de um mar completamente doce,
de um mar feito de amor... de sonho e de meiguice! 

(J G de Araujo Jorge)


Author: Betânia Uchôa
•06:59:00
Memória
Amar o perdido
deixa confundido
este coração.
Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão
Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão..
Carlos Drummond de Andrade 
Author: Betânia Uchôa
•06:57:00
A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.

(Cora Coralina)

Author: Betânia Uchôa
•06:54:00


ESSA LEMBRANÇA QUE NOS VEM
Essa lembrança que nos vem às vezes...
folha súbita que tomba
abrindo na memória a flor silenciosa
de mil e uma pétalas concêntricas...
Essa lembrança...mas de onde? de quem?
Essa lembrança talvez nem seja nossa,
mas de alguém que, pensando em nós, só possa
mandar um eco do seu pensamento
nessa mensagem pelos céus perdida...
Ai! Tão perdida
que nem se possa saber mais de quem!

MÁRIO QUINTANA

Author: Lenara
•09:08:00

Não sejas o de hoje.
Não suspires por ontens...
não queiras ser o de amanhã.
Faze-te sem limites no tempo.
Vê a tua vida em todas as origens.
Em todas as existências.
Em todas as mortes.
E sabes que serás assim para sempre.
Não queiras marcar a tua passagem.
Ela prossegue:
É a passagem que se continua.
É a tua eternidade.
És tu.

Cecília Meireles
Author: Lenara
•08:26:00

AS SEM RAZÕES DO AMOR

Eu te amo porque te amo,
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.

Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.

Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE


By Roberta
Author: Lenara
•06:55:00
 

Viver é acalentar sonhos e esperanças,
fazendo da fé a nossa inspiração maior.
É buscar nas pequenas coisas,
um grande motivo para ser feliz!

Mário Quintana


Author: Betânia Uchôa
•07:18:00


Chega de Saudade

Vai, minha tristeza, e diz a ela
Que sem ela não pode ser
Diz-lhe, numa prece, que ela regresse
Porque eu não posso mais sofrer

Chega de saudade, a realidade é que sem ela
Não há paz, não há beleza
É só tristeza e a melancolia
Que não sai de mim, não sai de mim, não sai

Mas, se ela voltar, se ela voltar
Que coisa linda, que coisa louca
Pois há menos peixinhos a nadar no mar
Do que os beijinhos que eu darei na sua boca

Dentro dos meus braços
Os abraços hão de ser milhões de abraços
Apertado assim, colado assim, calado assim
Abraços e beijinhos e carinhos sem ter fim

Que é pra acabar com esse negócio de viver longe de mim
Não quero mais esse negócio de você viver assim
Vamos deixar desse negócio de você viver sem mim

Vinícius de Moraes
Author: Betânia Uchôa
•10:29:00


Alga

Passa a noite calma
O silêncio da brisa...
Acontece-me à alma
Qualquer cousa imprecisa....

Uma porta entreaberta...
Um sorriso em descrença...
A ânsia que não acerta
Com aquilo em que pensa.

Sombra, dúvida, elevo-a
Até quem me suponho,
E a sua voz de névoa
Roça pelo meu sonho...

Fernando Pessoa 
Author: Betânia Uchôa
•10:27:00
Dois e Dois são Quatro
Como dois e dois são quatro 
Sei que a vida vale a pena 
Embora o pão seja caro 
E a liberdade pequena 
Como teus olhos são claros 
E a tua pele, morena 
como é azul o oceano 
E a lagoa, serena 
Como um tempo de alegria 
Por trás do terror me acena 
E a noite carrega o dia 
No seu colo de açucena 
- sei que dois e dois são quatro 
sei que a vida vale a pena 
mesmo que o pão seja caro 
e a liberdade pequena.
Ferreira Gullar
 
Author: Betânia Uchôa
•10:21:00



A loucura chamada afirmar, a doença chamada crer, a infâmia chamada ser feliz — tudo isto cheira a mundo, sabe à triste coisa que é a terra. Sê indiferente. Ama o poente e o amanhecer, porque não há utilidade, nem para ti, em amá-los. Veste teu ser do ouro da tarde morta, como um rei deposto numa manhã de rosas, com Março nas nuvens brancas e o sorriso das virgens nas quintas afastadas. Tua ânsia morra entre mirtos, teu tédio cesse então e o som da água acompanhe tudo isto como um entardecer ao pé de margens, e o rio, sem sentido salvo correr, eterno para marés longínquas. O resto é a vida que nos deixa, a chama que morre no nosso olhar, a púrpura gasta antes de a vestirmos, a lua que vela o nosso abandono, as estrelas que estendem o seu silêncio sobre a nossa hora de desengano. Assídua a mágoa estéril e amiga que nos aperta ao peito com amor.  
Livro do Desassossego - 
Fernando Pessoa
Author: Betânia Uchôa
•08:59:00
Traze-me

Traze-me um pouco das sombras serenas
que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas,
- vê que nem te peço alegria.
Traze-me um pouco da alvura dos luares
que a noite sustenta no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares:
- vê que nem te peço ilusão.
Traze-me um pouco da tua lembrança,
aroma perdido, saudade da flor!
-Vê que nem te digo - esperança!
-Vê que nem sequer sonho - amor!

Cecília Meireles
 
Author: Betânia Uchôa
•08:54:00


Círculo Vicioso

Bailando no ar, gemia inquieto vaga-lume:
– “Quem me dera que fosse aquela loura estrela,
Que arde no eterno azul, como uma eterna vela!”
Mas a estrela, fitando a lua, com ciúme:

– “Pudesse eu copiar o transparente lume,
Que, da grega coluna à gótica janela,
Contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela!”
Mas a lua, fitando o sol, com azedume:

– “Mísera! tivesse eu aquela enorme, aquela
Claridade imortal, que toda a luz resume!”
Mas o sol, inclinando a rútila capela:

– “Pesa-me esta brilhante auréola de nume...
Enfara-me esta azul e desmedida umbela...
Por que não nasci eu um simples vaga-lume?” 

Machado de Assis (1839-1908)
Author: Betânia Uchôa
•08:51:00

Ah! O AMOR

De Almas Sinceras a União Sincera
Nada Há Que Impeça:
- Amor Não é Amor Se Quando
Encontra Obstáculos Se Altera
Ou Se Vacila ao Mínimo Temor.
Amor é Um Marco Eterno,Dominante
Que Encara a Tempestade Com Bravura
É Astro Que Norteia a Vela Errante
Cujo Valor Se Ignora Lá na Altura.
Amor Não Teme o Tempo,Muito Embora
Seu Alfanje Não Poupe a Mocidade
Amor Não Se Transforma de Hora em Hora
Antes Se Afirma Para a Eternidade.
Amor Quando é Amor Não Definha
E Até o Final das Eras Há de Aumentar
Mas Se o Que Eu Digo For Erro
E o Meu Engano For Provado
Então Eu Nunca Terei Escrito
Ou Nunca Ninguém Terá Amado.

Willian Shakespeare -